O Xadrez e a Música

domingo, fevereiro 25, 2007

Enquanto Houver Tempo

Soneto dedicado à M.ª João


MOTE

“Enquanto houver Tempo”


(dado pela Maria João)


SONETO


Tempo é “ser” muito misterioso,
guloso de todo o bom adjectivo,
inimigo feroz do negativo,
oscila entre feliz e horroroso.

Será nosso Futuro tenebroso?
Esperar-nos-á algo estimativo?
Quem dita o Bem e o Mal é generoso?
Havendo Mal proporciona lenitivo?

Desvendo agora a causa destes versos,
prestando homenagem, com todo o coração,
à professora amiga Maria João.

E agradecimentos, porque dela obtive
força para varrer temores adversos.
E ,“enquanto houver tempo”, gritarei: VIVE!


R.C. Nascimento
24 Fevereiro 2007

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Pedido de um Mote à D.ª Maria João


Agradecendo o seu beijo
de amizade sincera,
não quero que seja quimera
este meu simples desejo:
que em seu pensamento brote
o que a Musa sugerir,
palavra a constituir
um belo e ardente Mote!
(R.N. 07-02-21)

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

TESTAMENTO DA VELHA




Este é o meu testamento
que eu fiz neste momento
em que digo adeus à vida.
Sentia a garra da Morte
a apertar-me o gasganete,
terrível, qual diabrete.

Mandei chamar o vigário,
o médico, o boticário,
uma benzedeira d´olhados;
no momento derradeiro
apareceu o cangalheiro
e quatro gatos-pingados.

Já traziam o caixão,
fiquei cheinha de horror
e soltei tremendo berro.
Nisto, oiço o Sacristão:
“Pregunta o Senhor Prior
a que horas é o enterro”.

Toda a gente em alta grita
quer ser primeiro atendida;
vem de lá o cangalheiro
com um metro de carpinteiro,
quer tirar-me a medida.
“Espere lá – diz o Doutor –
não queira ser metediço;
deixe a velhota auscultar
e depois de eu receitar
faça então o seu serviço.”

O boticário, exaltado,
´té arrepela os cabelos.
E a benzedeira d´olhados,
p´ra afugentar os maus fados,
vai espetando novelos...

Já farta de confusões,
pus essa gentinha a andar
e pensei com os meus botões:
p´ràs minhas disposições,
vou o notário chamar.

E fiz este testamento
de bens móveis e imóveis
e até de semoventes.
Se não agradar a todos,
Sempre é certo que p´los modos,
Vocês são muito exigentes.


Deixo à antiga Direcção
coisas de grande estadão:
ao Amílcar, um capacho,
para a falta de penacho.
E agora sem piada,
esta deixa que é sentida:
que torne a amar a Vida
e recobre a cor rosada.
E não se vá de longada,
é também desejo meu,
para sítio ignorado;
antes volte ao Ateneu,
onde tanto é estimado.

Ao Pacheco relojoeiro,
deixo um disco bem gravado
com um discurso inflamado
p´ra convencer o parceiro.
Poupará muito dinheiro
aproveitando o seu tempo,
porque os dias estão maus.
E no fim de toda a prosa
diz o disco em voz chorosa:
“o concerto é 20 paus.”

Também ao nosso Guilherme
da Circuncisão chamado,
eu vou fazer um legado
que é mesmo de pasmar:
aqui lhe deixo ficar
um triste encargo, afinal,
é ir ao meu funeral
com cara de sentimento.
Como não sou egoísta,
E como ele é um artista,
se for só, nada lamento,
´té dispenso a multidão,
basta-me o seu rabecão
para o acompanhamento.

Ó Marques, tu marcas sempre,
tu marcas em toda a parte,
destacas de toda a gente,
tens elegância e tens arte.
O que é que eu hei-de deixar-te
que te alegre o rir já franco?
Como tens bom coração,
olha, aí fica um tostão
para as falhas lá do Banco.

Machadinho, querido filho,
já não chego a ser avó,
já não canto o sol-e-dó,
já não trauteio o estribilho.
E na hora de morrer,
certo voto vou fazer,
que vai espantar os mirones:
como tens linhaça e lata,
deixarás os Telefones,
passarás a diplomata.

E deixo ao Henrique Dias,
uma pedra de amolar,
onde ele sem arrelias,
possa a tesoura afiar.
E também lhe quero legar
um tinteiro e três canetas
que ele poderá usar
no jornal que vai fundar,
“O Almocreve das Petas”.

Não esqueço a Orquestra Pontes,
tão cheia de cor e vida.
Eu, uma velha carcomida,
quando a ouvia tocar,
ainda sentia ganas
de ir pular e dançar.
E pelos votos que faço,
verás tu, amigo Pontes,
que eu não tenho mau génio;
que toques por vales e montes,
contratado pelo Eugénio.
E já alta madrugada,
depois de muito tocares,
paguem à rapaziada,
além da massa fixada,
umas horas suplementares.

E deixo ao José Faria,
Uma garganta de prata,
pois, como tem muita lata,
´inda ópera cantar podia.
E indo abrir loja nova,
para endireitar a vida
vou-lhe dar uma receita:
nada venda por medida,
mas sim tudo obra já feita.
E aos sócios em geral,
eu quero dar um conselho:
passem ali p´lo bufete
que há lá um vinho velho
que é de tirar o barrete.

Ao Nogueira vou dizer
aqui, sem que ninguém ouça:
casa depressa com a moça,
não esperes envelhecer.
Se ela. já farta de esperar,
te vem a dar com a janela,
não tornas a encontrar
uma pequena como ela.

E falando das senhoras,
só elogios posso ter
à sua elegância e graça...
o perfume que perpassa...
enfim, todos estão a ver.
Deixo-lhes um grande valor
que poderão pôr à prova:
isto é, um filtro d´amor
do mágico Barzabum.
Mostrem do que são capazes,
façam ralar os rapazes;
quando eu era também nova,
não me escapava nenhum.

E tu, ó Pereira da Silva,
cada vez estás mais menino,
e como nasceste em Março,
´inda hás-de ser Marcelino.
Visto a vida estar bicuda
vais apanhar a taluda;
deixo-te uma benzedura
para curares a mordedura
que te deram certos cujos,
e assim poderes arejar,
espanejar e lavar,
processos velhos e sujos.
À Orquestra dos Fininhos,
alguns sambas deixaria
se soubesse que ainda dançam
o Macedo e o Faria.
Mas como um agora é tropa
e o outro anda arredio,
levo os sambas para a cova
e não solto mais um pio.

E ao Agostinho Albino,
eu cá não deixo nem bóia,
pois já tem muito de seu,
que desde a guerra de Tróia,
ainda não apareceu
neste mundo uma outra Helena
que chegue à sua pequena.

Ao Arnaldo então eu deixo
um bom vaporizador
e uns maus cheiros muito finos
que é para ele seringar
determinados meninos
que se juntam lá na loja
a fazer sala de estar.

Fialho, vou-te deixar
em honra ao teu bigodinho,
uma incumbência taluda:
escreve para o “Pensa e Estuda”,
que aquilo está muito fraquinho.

Ao animador Candeias
vou contemplar de tal modo
que até se vai derreter...
deixo este espólio todo:
uns sapatos e umas meias
que eram do Fred Astaire.

Ao Soares, sempre animado,
bom amigo que se tem,
deixo trinta corridinhos
para ele dançar aos pulinhos,
ele é que sabe com quem.

Ao Arôcha quero deixar
uma coisa que lhe preste
nunca será codilhado
sempre que tenha arranjado
quatro trunfos de Ás e Best.

Esgotados os meus haveres,
ao findar o meu sofrer,
no momento derradeiro,
´inda tenho um gesto terno:
entrego a alma ao Inferno,
deixo a carcaça ao coveiro.

VELHA GAITEIRA

(R.C.NASCIMENTO)

(Lido pelo Autor no ATENEU SETUBALENSE, Baile de Mi-Carême, em 22 de Março 1941)

sábado, fevereiro 17, 2007

O CHINÊS TA TCHI FU LI

O CHINÊS TA TCHI FU LI
TOCA FLAUTA DE BAMBU
QUANDO ACABA DE TOCAR
METE A FLAUTA NO... BAÚ!

(Autor desconhecido)


"Gu Su Xing"

(Foto LIU TEH FU - Rua da Felicidade, 29 - MACAU)

(GRANDE EXPOSIÇÃO DO MUNDO PORTUGUÊS - 1940)

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

AS RUAS DA MINHA VIDA
(Dedicado ao Dia de S. Valentim)


As Ruas da Minha Vida

- FADO -

I

Foi na Travessa da Espera
que te esperei inutilmente;
senti que o desejo mente,
chamei à esperança, quimera.
A incerteza, essa fera,
hora após hora enfrentei,
se alguma vez desesperei,
foi na Travessa da Espera.

II

Mudei p'rà Rua da Esperança,
fiado numa crendice,
porque alguém um dia disse:
quem espera sempre alcança.
Acreditei na mudança,
sonhei uma nova vida
e em hora decidida,
mudei p'rà Rua da Esperança!

III

Velha Praça da Alegria,
disseste que o Amor voltava.
Quando entrei, acreditava,
quando saí... já não cria.
Foste apenas fantasia,
agora perdeste a fama,
quem te amava já não ama,
velha Praça da Alegria.

IV

No Beco do Fala-Só,
há um clube recatado,
num Carnaval mascarado,
lá fomos, de “Dominó”.
Não quero que só por dó,
penses um dia voltar,
antes quero a sós falar,
no Beco do Fala-Só.

V

Triste Rua da Saudade
transformaste esta amargura
numa vida de loucura,
andei louco p´la cidade.
A tua deslealdade
bradava à Terra e aos Céus,
e eu por fim te disse adeus,
triste Rua da Saudade.

VI

Moro na Rua da Emenda
mas tu nunca te emendaste,
dessa vida que levaste,
numa amarga, infeliz senda.
não é que eu me arrependa,
de ter gostado de ti;
mas emendei-me e esqueci:
moro na Rua da Emenda!


Letra e Música de Rui Nascimento
25-06-1997

Este poema ganhou o 2º Prémio dos Jogos Florais do SAMS de 2006.



"QUANDO ALGUÉM SE DISPÕE A ESCREVER, DEITA SEMPRE COISAS BONITAS CÁ PARA FORA"

(Frase de um dos membros do Júri)

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

O TOLO SENTADO

Tolo Sentado
TOLO SENTADO

Medita, oh tolo que ostentas
poder, em trono altaneiro,
e, afinal, tu só te sentas
sobre o teu próprio traseiro


Num Mundo em dissolução,
cheio de notícias cruentas,
vê se não tenho razão,
condenando a ostentação;
Medita, oh tolo que ostentas.

Tu, em luta malfazeja
queres sempre ser o primeiro;
corrói-te a cruel inveja,
sem conseguires que se veja
poder, em trono altaneiro.

Queres clamar, pôr-te em pé,
dar ordens, mesmo violentas,
mas a triste verdade é
que perdeste esperança e fé
e, afinal, tu só te sentas.

Pára, pois, de ter em mente
só dar valor ao dinheiro.
Para a todos fazeres frente,
senta-te comodamente,
sobre o teu próprio traseiro.


R. NASCIMENTO 2004